sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

O surpreendente litoral do Piauí

Ventos atraem praticantes de kitesurfe de todo o mundo para as praias do Piauí 
A prática de kitesurfe, uma febre que vem atraindo brasileiros e estrangeiros
O Piauí é o destino menos conhecido da Rota das Emoções. Por isso mesmo, pode ser o mais surpreendente. Tem rio para quem quer rio e praia para quem quer praia. A extensão do litoral piauiense é pequena — são apenas 66 quilômetros — mas sobra espaço para descanso, mergulho e para a prática de kitesurfe, uma febre que vem atraindo brasileiros e estrangeiros.

Para quem sai do Maranhão, a opção é um transfer de carro 4x4 da Praia do Caburé (a 15 minutos de lancha de Atins) até Parnaíba, no litoral do Piauí (a R$ 800, um carro para quatro pessoas). São quase quatro horas de trajeto, e a saída é bem cedo, por conta da maré. Para quem tem menos tempo e mais condições, o trajeto também pode ser feito de helicóptero. Caso contrário, há linhas de ônibus que fazem o trajeto a Parnaíba a partir de Tutoia e Paulino Neves, também no Maranhão e o valor é bem atrativo.

O SANTUÁRIO DO PARNAÍBA
Parnaíba é uma cidade que cresce com um turismo também em expansão. Um dos maiores atrativos é o Delta do Parnaíba, um santuário ecológico de 2.700km² com dunas, mar e lagoas e mais de 70 ilhas. É o terceiro maior delta oceânico do mundo, depois dos rios Mekong (Vietnã) e Nilo (África), e o único em mar aberto das Américas.
Passeio pelo mangue em Barra Grande, Piauí - Elisa Martins / Agência O Globo
O passeio mais famoso sai do Porto dos Tatus (cerca de R$ 60 por pessoa) e navega nas águas escuras do Parnaíba, um rio totalmente nordestino. De um lado, está o Piauí. Do outro, o Maranhão. No lado maranhense fica a Ilha das Canárias, bem perto da foz. O caminho continua pelo Rio Parnaíba, uma das maiores bacias hidrográficas do Brasil. Do barco, dá para imaginar como seria ainda mais selvagem a paisagem na época em que índios tremembés moravam por ali. Hoje, a figura mais frequente nas margens de mangue vermelho do rio é a do catador de caranguejo.

O Piauí é a maior reserva de caranguejos da região. Por isso é comum passar por barcos de catadores no Parnaíba. Eles saem muito cedo de casa, e passam de seis a oito horas no mangue em busca dos caranguejos machos que meçam a partir de seis centímetros — a coleta dos menores e das fêmeas é proibida.
Catador mostra caranguejo no Delta do Paranaíba, no Piauí: atividade econômica importante da região - Elisa Martins / Agência O Globo
O solo fresco é pura lama. O pé afunda, há muitos galhos retorcidos. Para achar os caranguejos, é preciso enfiar o braço nas tocas, cavadas pelos animais no chão cinza escuro. E não faltam mosquitos. Para aguentar, muitos catadores passam óleo diesel na pele e também se cobrem de lama. Alguns ainda andam com uma latinha que faz fumaça para espantar os borrachudos.

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Estimam-se uns três mil catadores na área de proteção ambiental do delta. O trabalho difícil garante o sustento de muitas famílias da região. A maioria dos caranguejos é vendida para o Ceará.

Depois do mangue, as águas mornas do Parnaíba são perfeitas para mergulho. O banho no pôr do sol é um presente. Mas o passeio não acaba aí. O rio tem entre 70 e 80 ilhotas, que aparecem e desaparecem com a maré.

Uma das mais famosas é a do Caju, dormitório de bandos de aves guarás. No fim da tarde, elas pintam o céu de vermelho quando voam em direção à ilha para descansar.
Quadro em restaurante da região do Delta do Parnaíba, no Piauí, retrata a atividade dos catadores de caranguejo - Elisa Martins / Agência O Globo

Árvore penteada
O guará não nasce com essa cor. Mas fica assim por conta da alimentação. O guará come o caranguejo chama-maré, ou aratu, que por sua vez come as folhas do mangue, ricas em tanino — que causa essa pigmentação vermelha nas aves.

Quando os guarás enchem a Ilha do Caju, é hora de voltar também. Navegar nas águas escuras do Parnaíba é bonito de dia, mas não tão tranquilo à noite, quando só ficam os habitantes: guarás, caranguejos, peixes de quatro olhos e o jacaré-de-papo-amarelo. Além do vento, que não para no Piauí.

Um dos maiores símbolos dessa fábrica de ventos natural é a “árvore penteada”. O sopro forte envergou o caule de um tamarindeiro, que virou atração turística no município de Luís Correia, outro ponto da Rota das Emoções.
A 'árvore penteada': um tamarindeiro envergado pela força dos ventos em Luís Correia, um dos municípios do Piauí que integram a Rota das Emoções
Elisa Martins / Agência O Globo
Ali ficam também praias que valem a visita, como Atalaia, Coqueiro, Itaqui, Maramar e Macapá. A última parada é Barra Grande, no município de Cajueiro da Praia, e point agraciado pelos ventos para o kitesurfe. A vida noturna também é agitada, e muitos chamam Barra Grande de “a próxima Jeri”, em alusão à vila famosa no Ceará.

Para quem busca novidades mais diurnas, está a observação de cavalos-marinhos (a R$ 60). O tour começa, na verdade, de charrete, que sai de Barra Grande e 15 minutos depois para em um pequeno porto na beira de um igarapé de manguezais.
Praia de Atalaia em Luis Correia
Há muitos caranguejos e garças pelo caminho. E, claro, pausa para banho. Depois, já perto do mar, um guia mergulha de snorkel. Faz mistério. Então levanta um aquário de vidro, com um cavalo-marinho dentro. Os animais vivem e se reproduzem ali. Parecem delicados, e sua principal defesa é a cauda, com a qual se enrolam nas raízes do mangue. Os turistas tiram fotos. O guia destaca a importância de preservar a espécie. A melhor parte é quando o cavalo-marinho é devolvido ao seu habitat. Nessa rota, a natureza viva e bruta é que emociona.

Por Elisa Martins/O Globo 

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